sábado, 8 de maio de 2010

O Povo Brasileiro :: Uma Nação à Própria Margem

O Brasil do século XVI e XVII era o maior mercado, e mais rico, do mundo. A riqueza gerada pela exportação de açúcar, comparativamente aos dias de hoje, era igual à gerada pela exportação do petróleo. Somado a isso ainda éramos grandes produtores de ouro, diamantes e demais pedras preciosas. Toda essa prosperidade estava baseada no extrativismo humano, na escravidão que não estava restrita somente aos negros. A opressão exercida sobre o povo, arremetido à miséria e privado de condições sociais básicas era instrumento de manipulação das massas, exercido por uma “elite” dominante. A sociedade produtiva era renegada a guetos. As diferenças sociais eram gritantes apesar da abundância de todas as riquezas.

Nestas terras, ricas em ouro e diamante, muitos escravos conseguiram comprar a liberdade e enriquecer. Assim surgiu uma classe intermediária formada de mulatos e negros libertos, que conseguiram melhorar de vida e se dedicar às atividades de ourives, carpinteiros, ferreiros e artistas. Ouro Preto viu florescer a mais alta expressão da civilização brasileira. Na música, na poesia e na arquitetura o mineiro deixou sua marca. Entre eles um brasileiro, mulato de grande talento, que traduziu na pedra tosca a sofisticação do barroco europeu: Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.

A mineração de ouro e diamante alterou profundamente o aspecto rural e desarticulado do país. Até então, os brasileiros viviam isolados uns dos outros devido às grandes distâncias. Mas a rede de intercâmbio comercial que começava a se formar entre as capitanias daria uma bela base econômica à unidade nacional. O sertão nordestino, que vivia da criação de gado, fornecia a carne e o couro. A sede do governo foi transferida de Salvador para o Rio de Janeiro, devido à proximidade das Minas. E o Rio Grande do Sul acabou sendo incorporado ao país através do comércio de mulas.

O Brasil Crioulo



“Esse país tomou conta de si pela primeira vez num movimento fantástico... a Inconfidência Mineira...” – Darcy Ribeiro.

Nas escolas não se ensina que o movimento idealizado por uma elite intelectual previa uma nova organização da sociedade. Entre os planos dos inconfidentes estavam a criação de universidades acessíveis a todos, a instalação de indústrias e a libertação dos escravos. A inspiração maior vinha dos ideais da Revolução Francesa e de um novo país da América do Norte, os Estados Unidos. Uma denúncia acabou levando à forca um dos líderes do movimento: o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

“Tiradentes foi esse herói nacional fantástico, um homem sábio, engenheiro que fez o serviço de águas do Rio de Janeiro, que fez o planejamento dos portos do Rio... e que conspirou na Europa, em Portugal e conspirou com os norte-americanos também. Era um intelectual que lia, conhecia a constituição americana e queria fazer uma república. Era respeitado pelos magistrados, pelos coronéis militares, pelos poetas, por aquele grupo atípico de Minas que quis criar uma República Brasileira, criar um Brasil e criar brasileiros, dando dignidade. Mas os portuguesas abafaram isto tão bem que continuou soterrada a idéia de liberdade e de autonomia do Brasil...” – Darcy Ribeiro.

Trinta anos depois da rebelião dos inconfidentes, o Brasil se tornava império autônomo. Mas levaria quase cem anos para extinguir o trabalho escravo em seu território. Durante trezentos anos o país usou cerca de doze milhões de negros como principal força de trabalho em seu processo de formação. Trazidos do Sudão, da Costa do Marfim, da Nigéria, de Angola e de Moçambique, essa gente marcaria com sua cor e com sua força a fisionomia e a cultura brasileiras. E, ao final do período colonial, era uma das maiores populações do mundo moderno.

O Brasil só se tornou verdadeiramente uma nação com a abolição da escravatura, que concedeu aos negros, ao menos no papel, a igualdade civil dos demais membros de seu povo. Emancipados mas sem a terra que cultivaram por quase quatro séculos, os ex-escravos abandonaram as fazendas e logo descobriram que não podiam ficar em nenhum lugar. A terra tinha dono. Saindo de uma fazenda caíam em outra, de onde eram, também, fatalmente expulsos.

“No agreste, depois nas caatingas e por fim nos cerrados desenvolveu-se uma economia pastoril associada a produção açucareira como fornecedora de carne, couros e bois de serviço”. Foi sempre uma economia pobre e independente. As atividades pastoris conformaram não só a vida, mas a figura do homem do gado.

O Brasil Sertanejo


“Nos Estados Unidos as pessoas iam para o Oeste. Elas iam porque sabiam que se construíssem uma casa, fizessem uma roça ganhavam o direito de demarcar uma fazenda de 30 hectares. Aqui isto nunca deu certo porque um pequeno grupo monopolizou a terra, obrigou o povo a sair das fazendas. Eles não dividiam e sim expulsavam. Não é que eles usem a terra. Eles não usam dez por cento da terra que existe, mas expulsaram. E essa gente que foi expulsa vem viver uma vida miserável na cidade.” – Darcy Ribeiro.

Em 1850 as regras de acesso à propriedade rural mudaram. A simples ocupação e cultivo já não bastavam para garantir a posse. O registro obrigatório acaba expulsando da terra os menos favorecidos.

“A história da reforma agrária, no Brasil, é uma história de oportunidades perdidas. Ainda colônia de Portugal, o Brasil não teve os movimentos sociais que, no século 18, democratizaram o acesso à propriedade da terra e mudaram a face da Europa. No século 19, o fantasma que rondou a Europa e contribuiu para acelerar os avanços sociais não cruzou o Oceano Atlântico, para assombrar o Brasil e sua injusta concentração de terras. E, ao contrário dos Estados Unidos que, no período da ocupação dos territórios do nordeste e do centro-oeste, resolveram o problema do acesso à terra, a ocupação brasileira - que ainda está longe de se completar - continuou seguindo o velho modelo do latifúndio, sob o domínio da mesma velha oligarquia rural”. Esse é um assunto de extrema importância para a nação brasileira, pois envolve fatores como desenvolvimento (urbano e social), distribuição de renda, justiça e segurança – não somente a nacional, mas também a do dia a dia dos centros urbanos. A visão atual que temos de reforma agrária está relacionada à imagem vinculada pelas mídias de um movimento de “Sem terra” destruindo propriedades rurais e pés de laranja. Caso haja interesse em aprender mais sobre os detalhes históricos desse assunto, acesse a página: Reforma Agrária - Compromisso de todos, do site oficial de nossa República.

As grandes capitais são o retrato do crescimento desordenado das cidades brasileiras no século XX. Entre 1920 e 1960 a população urbana cresceu dez vezes. Hoje, quase 70% dos brasileiros moram em cidades. As maiores transformações foram sentidas nos centros urbanos, mas elas são reflexos do que ocorreu no campo. Em toda a história brasileira, as mudanças de regime pouco afetaram a ordem social. Durante o período colonial e depois no Império e na República, o poder na zona rural sempre foi baseado no monopólio da terra e na monocultura. Aqui nenhuma terra foi reservada para o povo que continua formando uma nação que, com amor e orgulho, chamamos de Brasil.

São Paulo, cidade fundada em 1554, é hoje o espelho desse nosso Brasil.. Uma megalópole com aproximadamente 20 milhões de habitantes. A sexta maior aglomeração urbana do mundo e a terceira unidade política mais populosa da América do Sul. Olhando com atenção seus bairros e sua gente é possível perceber todas as contradições do país. O Brasil rico, moderno, inicia o século XXI como a oitava economia do planeta, com a previsão de ser a quinta até 2014. Mas também o Brasil que não acompanhou o progresso. O país que ainda luta por melhores condições de vida para nós – o seu povo.

Na próxima postagem iremos abordar O Brasil Caipira e O Brasil Sulino.

Até lá !